Na terceira idade, Ângela Reis fez intercâmbio no Canadá, em três meses de curso de inglês em Vancouver. Ficou em casa de família. Aos 62 anos, ela melhorou seu nível de idioma e se sentiu revigorada com a convivência com os mais jovens na escola.
A ideia de estar numa sala de aula com vários adolescentes provocava
em Ângela Reis dúvidas sobre o intercâmbio na terceira idade no Canadá
— “achei que fosse ser um saco” —, mas a surpresa veio na intensidade
do quanto foi interessante interagir com os alunos mais jovens: “A
relação foi maravilhosa”. Aos 62 anos, a psicoterapeuta corporal, que
vive no Rio de Janeiro, fez três meses de curso de inglês em Vancouver
neste ano. Sentiu alguns estranhamentos, mas voltou em julho encantada.
“Fui muito importante a experiência: com a idade que eu tenho você
ousar fazer isso!” Ângela conta que, com o passar dos anos, batia uma
certa preguiça de se aventurar em algo tão novo. “Você fica querendo
viajar sempre com gente conhecida”, diz. Ela já tinha ido a países da
Europa e da América do Sul, mas nunca havia feito intercâmbio.
Mas uma amiga dela havia se mudado para o Canadá, e Ângela queria
aprofundar seu conhecimento de inglês. “Tinha muito anos que eu não
estudava. A cada vez que viajava sentia falta de mais fluência. Falar
inglês sempre facilita”, afirma a psicoterapeuta corporal, que usava o
idioma para acompanhar estudos na sua profissão. “Tinha isso como uma
meta: voltar a estudar, retomar a língua”, diz a carioca, que decidiu
fazer a viagem para estudar pela Canadá Intercâmbio.
A escolha por Vancouver não foi apenas por causa da amiga, ela
explica: “É uma cidade do Canadá com clima mais agradável.” Para evitar o
inverno, marcou a viagem para maio. O intercâmbio no Canadá, no
entanto, mostrou na prática à Ângela por que Vancouver é chamada de
Raincouver — não à toa o apelido incorpora a palavra ‘chuva’ em inglês
ao nome da cidade. “Peguei chuva e frio em maio.” No início, como boa
carioca, ela pensava em ver o tempo melhorar para dar um passeio. “Minha
amiga me disse: ‘Se for esperar parar de chover, você não sai nunca’. A
primeira coisa que fiz foi comprar um casaco de chuva.”
Casa de família
Ângela ficou dez dias na casa da amiga. Depois, foi para a casa de família. O home stay, com direito a café da manhã e jantar, foi a parte mais desafiadora da viagem. “As famílias com que adolescentes da turma estavam eram mais receptivas. Onde eu fiquei, não. A gente não se encontrava porque tinha horários diferentes. Via só no café da manhã. Eles não tinham disponibilidade, não tinham tempo”, lembra. “Não existia (a troca), e é uma família que faz isso há 10, 12 anos. Mas a convivência que achei que fosse ter não aconteceu.”
A carioca queria manter a dieta, mas não podia cozinhar. “Isso é
muito difícil. Eu moro sozinha e cozinho na minha casa. Eles comiam
muita fritura.” Também não gostou de não poder lavar a própria roupa.
“Detestei a experiência”, afirma Ângela. Ela diz que até tentou trocar
de família, mas que, como era alta temporada, a cidade estava cheia e
não havia disponibilidade.
Essas questões norteiam a experiência de ficar hospedado em casa de
família — o tipo de acomodação mais usado pelos brasileiros — e devem
ser acertadas antes da viagem, recomendam os especialistas. “Eu não
pensei nesses aspectos, fui impulsiva. Quero fazer, Vancouver todo mundo
diz que é legal. Peguei e fui.”
Para ir e voltar da escola, ela pegava ônibus e metrô. “Eles têm um
sistema muito bom. A espera pelo ônibus não era de mais de dez minutos.
Depois das 22 horas, passava de 40 em 40. Ok, você se organiza para
isso.” A rotina tranquila do transporte público chamou atenção de
Ângela. “O motorista para porque está no tempo de alongamento dele, e
todo mundo espera numa boa, ninguém reclama.”
Curso de inglês no Canadá
Ângela conta que chegou no intermediário básico e, ao longo do curso,
chegou à turma de inglês avançado. A carioca elogia a organização e a
atenção com os alunos por parte da escola VanWest, onde estudou. “Eles
cuidam de tudo, sabem quem está em que situação. Tem um consultor para
cada etnia.” Mas não curtiu tudo no programa, segundo ela, muito rígido.
“A gente tinha aulas de writing (escrita) e reading (leitura) pela manhã. De tarde, você tem eletivas. Pode ser listening (compreensão auditiva),
por exemplo”, diz a psicoterapeuta. “Mas a escola é muito focada na
preparação para os cursos de graduação, de college. Isso dá certo para a
maioria das pessoas, para adolescente serve. Mas não para quem tem uma
outra necessidade”, pondera. “Eu não vou fazer prova, não vou imigrar,
não ia ficar fazendo dissertação quatro vezes por semana”, afirma.
Marotamente, Ângela arrumou uma solução para praticar a língua:
“Matava umas aulas e ia para rua conversar em inglês.” Saía com os
amigos que fez entre outros alunos acima dos 50 anos: “Eram dois
paulistas e dois casais de Montreal”. Ela conta que usou bem o idioma e
ainda conheceu Vancouver.
Também visitou arredores e cidades próximas. A escola, como de
costume em programas de intercâmbio, oferecia passeios e excursões para
os alunos. Ela acabou não fazendo porque preferia saídas com mais
conforto. “Mais velha, a gente não quer mais ser mochileira, dividir
quarto com quatro. E lá eles tem muito programa com trilha.”
Preferiu, então, fazer os passeios com os amigos. Esteve em Whistler,
Capilano, Grouse Mountain e Victoria (“parece um cenário de tão linda,
com os jardins da cidade, e tem bons restaurantes”). Provou os vinhos da
província de British Columbia, mas gostou mesmo foi das cervejas
locais. “Eu adoro cerveja artesanal, provei várias.”
Interação entre gerações
Com os amigos mais jovens da turma, aprendeu sobre costumes e comidas
orientais. “Pedia a eles para me ensinarem como comer os pratos. Eles
queriam muito saber como era a minha vida no Brasil”, conta. “Os
asiáticos, minha nossa, como me tratavam com carinho, com uma
cordialidade.”
Na primeira vez no Canadá, aliás, a psicoterapeuta corporal teve como
maior estranhamento uma característica positiva. “As pessoas são muito
educadas. Eu estou numa tristeza com o Rio. Foi muito interessante sair
daqui nesse momento caótico. Nessa falta de educação que a gente vive no
Brasil. Foi bom conviver, ver que tem outro lugar diferente.”
A ótima interação entre gerações e a gentileza nos gestos do dia a
dia impressionaram a brasileira. “Senti muito essa mudança de perfil.
Foi uma descoberta inacreditável”, afirma. “Essa troca que tive lá,
enxergar esse mundo novo, me deu uma animada. Foi muito intenso.”
Fonte: Estadão
Fonte: Estadão
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